segunda-feira, 8 de outubro de 2007

O DIA EM QUE O REINO UNIDO VIROU UMA... PENÍNSULA

É duro acreditar que o ensino das instituições públicas deste país já não é o mesmo de outrora. Se é duro acreditar, não existe palavra que defina o que é viver isto na pele. Pois, bem... eu e mais uma porrada de gente vivemos isso dia após dia.

Dizer que leva sete disciplinas pra frente na Federal não significa muita coisa, nem muito trabalho, quanto menos esforço algum. Balela.

Primeiro que não existem cadernetas. É só você ser um pouquinho corrupto e pedir pra alguém colocar o seu nome na lista que, voilá, temos aqui uma aprovação garantida. Mas, veja bem, essa artimanha só precisa ser utilizada com os professores mais atentos. Para os desatentos você não precisa nem se matricular na disciplina. Basta estar em alguma outra que tenha certo tipo de ligação com a qual você nem sabia que ia passar, mas passou... e com 8,o.

Não é de se estranhar, portanto, que aulas que, supostamente, seriam de Sociologia da Comunicação virem aulinhas de história daquelas que eu tinha na 8ª série, na escola que só me ensinava a decorar a revisão para garantir a aprovação ao final do ano. Ainda não descobrimos como o poder do Anjo Protetor dos Alunos Lúcidos da Federal conseguiu nos mudar para um professor que realmente leva discussões legais pra sala de aula (apesar de o cabelo dele constantemente dispersar toda a minha atenção).

O que tenho falado até agora mais parece um mar de rosas em nossas vidas de estagiários (ex, no meu caso), que nos lascamos driblando o tempo de todas as maneiras para que consigamos dar tempo (ao menos) das aulas das 7 disciplinas.

A rotina começa às 14h, todo santo dia. Sai do estágio, com fome, calor e ainda suportando emissão máxima de raios ultravioletas nesta capital. Pega um ônibus indigno de tão quente, cheio e lerdo para poder chegar aos arredores da Instituição de Ensino Superior e lá ficar pelas próximas 6 horas (às terças, quintas e sextas), ou 8 horas (às segundas e quartas).

A primeira aula da semana é pra empolgar as almas mais amarguradas e terrivelmente condicionadas àquelas condições. No começo, elas não eram muito boas, tendo em vista que o professor perdia bons 40 minutos da aula anotando no quadro as coisas da apostila, e outros 60 lendo o que estava no quadro. Tortura mesmo sem fim. O sono me agarrava pelas entranhas e me puxava com tudo rumo à carteira (geralmente muito torta e desconfortável).

Hoje em dia, é a melhor aula. Como se trata do bloco de rádio, nós agora vamos pra um estudiozinho charmoso que só (tá, tem uns ácaros mas a acústica é muito boa) e ficamos lá gravando vinhetas e falando maloqueiragens no microfone, rindo bastante e divertindo o professor até umas 17h. A aula, normalmente, teria que ser até as 16h, mas como o próximo horário de 2h é livre, nos permitimos esse luxo. Merecemos, não?

Depois desta aula, vem a não-aula do professor que só foi uma vez desde que o período começou, no começo de setembro. É dose, mas somos obrigados a permanecer por lá das 16h às 20h, que é quando começa a aula que deu origem a este imenso e cansativo post. Enquanto isso, vamos comer sushi, sorvete ou ficar conversando nos mornos bancos de cimento do anfiteatro do CCE.

É chegada a hora. 20h, todo mundo cansado do dia, do calor, de falar besteira e até do professor das 18h, que sempre diz ter alguma doença pra não dar aula. Tudo isso já não é um bom presságio. Então, vem alguém com um problema de dicção terrível, que já se meteu a dar aulas de inglês e, apesar disso, continua falando insistentemente LicensINGUI Act.

Nunca me falaram muito bem desta criatura. Nem as pessoas que já haviam sido suas colegas de trabalho, nem os ex-alunos. Por sinal, ela tem um apelido muito curioso, que faz alusão ao Baby, da Família Dinossauro. Bom, mas eu sei que o que ela me mostrou hoje vai além de qualquer desafeto profissional ou birrinha de estudante mimado.

Eis que estamos lá, na sala fétida, sem termos feito os trabalhos que a Baby pediu pra hoje à noite. Não fizemos por uma série de motivos. Falta de tempo, de utilidade e de vontade são alguns deles. Ela pergunta, insiste, diz que vai dar pontos a quem falar, mas nada disso anima a turma. Não ainda. No que ela se mete a fazer suas próprias observações acerca do Bloqueio Continental. Um aluno que tem a alma elevada e estudou muita história sem decorebas na escola, resolveu ajudar. Explicou tudinho até bem e tal. A gente nem riu muito dele. Mas a professora insistia em querer ajudar.

Falou do Napoleão, da falta de "boa vontade" da vizinha Inglaterra para com ele, e de suas restrições ao comércio com a terra, por conta de interesses maiores. A localização, não é mesmo, minha gente? Segundo a professora, a Inglaterra era uma terra preciosa por ser uma PENÍNSULA. A alma do aluno do início da aula deu lá seus pinotes e não conseguiu mais ser tão elevada assim. Então, ele revela à professora que, na verdade, Inglaterra está numa ilha. Minha gente, o diálogo foi o seguinte:

- Aí, vocês sabem também que ele queria as terras da Inglaterra pela localização, afinal de contas, era uma península com amplo acesso aos mares, o que facilitava bastante o comércio! - Solta a professora.

- Não professora. Inglaterra fica numa ilha. - Fala o aluno de alma elevada.

- É península.

- Professora, península é um pedaço de continente que se estende ao mar, sem virar uma ilha.

- Tabom... então é uma península dentro de uma ilha. - Essa eu não pude deixar passar, hein? Notem... tomem nota disso.

- Professora, Inglaterra é numa ilha, eu tenho certeza!!! - Informa e afirma categoricamente nosso Prêmio Nobel da Geografia Física.

- Não... vocês estão confundindo península com continente!!!

Aí eu digo "Deus... eu mereço isto como premiação por ter resistido aqui durante 4 intermináveis horas?"

No que ele me responde me estimulando a ver o aluno de alma elevada cheirando o próprio sovaco e fazendo uma careta que denunciava seu próprio futum.

Mereço, eu sei que sim.