quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Rolinhas, andorinhas, pardais...

Quando eu tinha uns 5 anos, minha mãe chegou em casa segurando uma gaiolinha com uma pássaro dentro. Eu lembro bem de ter olhado pra mão dela e, sem entender muita coisa ouvi-la dizer “olha minha filha, a mamãe trouxe um passarinho lindo pra você. É uma rolinha”.

Eu nunca tinha ouvido falar dessa tal de rolinha. Mesmo assim, peguei a gaiola, fui lá pra sala de casa e fiquei admirando o bicho a se debater naquele cubo minúsculo, feito com pedaços de madeira. Tinha uma cuia com água, outra com alpiste e um monte de cocô pelo chão do lar da rolinha. Achei aquelas condições de moradia tão indignas, que soltei a bicha no chão da sala.

Acho que ela estava com as asas cortadas, porque em vez de voar, ela saiu correndo (pulando) feito rolinha louca que era. E eu fui atrás dela. Ela pulava 8 vezes e eu dava um passo. Até que a perdi de vista. Eu era feliz de ter soltado a rolinha e ela não viver mais naquele cubo fedido, com um pouco de água e comida e muita merda. Mas, o cubo continuava lá, caso ela quisesse voltar.

Ela não voltou. Tempos depois eu descobri que ela gostava de ficar atrás da geladeira. Não sei... devia ser quente e ela devia se sentir bem por lá, com uma muralha de proteção e eventuais caroços de arroz que caíam por ali, por ser perto do fogão. Vai ver ela gostava mesmo era de lugares empoeirados e pouco arejados. Vai ver ela era suicida.

A empregava gostava de limpar atrás da geladeira. Mas, limpava tão bem, que quando foi colocar a geladeira de voltar no lugar, imprensou a rolinha que esteve lá todo o tempo em que ela limpava. Imprensou e machucou feio a bichinha.

Peguei o pássaro na mão e fui acordar meu pai, que devia estar de ressaca. Ele não estava bêbado, eu lembro. Ou pelo menos acho que lembro. Ele estava lá, lânguido (o pássaro), arfando de dor e de vontade de morrer logo, vai saber.

- Pai, pai!!! A fulana matou minha rolinha! Matou minha rolinha!
- Não matou, Natália.
-Tá viva, pai? - Arregalava os olhos cheios de esperança de reaver em ótimo estado meu primeiro bicho de estimação.
- Tá viva, mas não muito.

Começávamos a caminhar para a área externa da casa, onde tinha uma pia e uma torneira. E um saco de lixo.

- Ela tá viva, mas tá sofrendo muito! A gente não pode deixá-la sofrer desse jeito.
(Crect)
- Pai... tu matou minha rolinha?
- Ela já ia morrer, Natália. Eu só amenizei o sofrimento dela.
(...)
-Tabom, pai. Depois a mãe traz outra pra mim.

Foi assim a morte do meu primeiro bichinho de estimação. Sem velório, sem músicas fúnebres, sem enterro glorioso com roupas pretas e dia chuvoso. Ela foi pro saco de lixo, sem sentimentalismos, sem delongas.

Nesse dia, meio sem querer, eu aprendi o que mais tarde descobriria nos livros e artigos científicos como eutanásia. Minha rolinha realmente ia morrer, dava pra ver no olhar.

E nunca mais tive um pássaro que morasse atrás da geladeira. Nem empregadas...